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dia 08/12/98

1ª ETAPA - PROVA DE LÍNGUA PORTUGUESA
E LITERATURA BRASILEIRA

Texto I

Educai o coração da mulher, esclarecei seu
intelecto com o estudo de coisas úteis e com
a prática dos deveres, inspirando nela o deleite
que se experimenta ao cumpri-los; purgai a
5 sua alma de tantas nocivas frivolidades pueris
de que se acha rodeada mal abre os olhos à luz.
Cessai aqueles tolos discursos com os quais
atordoais sua razão, fazendo-a crer que é
rainha, quando nada mais é que a escrava dos
10 vossos caprichos. Não façais dela a mulher
da Bíblia; a mulher de hoje em dia pode sair-
se melhor do que aquela; nem muito menos a
mulher da Idade Média: da qual estamos todas
tão distantes que não poder-nos-ia servir de
15 modelo; mas a mulher que deve progredir
com o século dezenove, ao lado do homem,
rumo à regeneração dos povos.
Guarde-se bem o homem de ter a mulher
para seu joguete, ou sua escrava; trate-a como
20 uma companheira da sua vida, devendo ela
participar de suas alegres e tristes aventuras;
considere-a desde o berço até seu leito de
morte, como aquela que exerce uma influência
real sobre o destino dele, e por conseguinte
25 sobre o destino das nações; dedique-lhe, por
último, uma educação como exige a grande
tarefa que ela deve cumprir na sociedade
como o benéfico ascendente do coração; e a
mulher será como deve ser, filha e irmã
30 dedicadíssima, terna e pudica esposa, boa e
providente mãe.
 

(1859)

Floresta, Nísia . Cintilações de uma alma brasileira.
Florianópolis / Santa Cruz: Ed. Mulheres / Ed. Da
UNISC, 1997. p. 115-7.


01
No texto I, o uso freqüente dos verbos no imperativo justifica-se pela necessidade de:

(A) mostrar que a escritora Nísia Floresta (1810 - 1855) escreveu sobre os direitos das mulheres, dos índios, dos escravos;

(B ) expressar uma ordem absoluta, isto é, uma ordem que deve ser cumprida sem condição, como se fosse um mandamento;

(C) exprimir uma orientação da autora para que se façam ações que, na sua opinião, têm o fim de melhorar a condição da mulher;

(D) fazer da mulher de hoje a mulher da Bíblia, porque pode, como a da Idade Média, servir-nos de modelo;

(E) educar o coração da mulher, dando ordens ao seu intelecto para a prática dos deveres que lhe trazem alegria.

 

02 A condição indispensável para que ocorra uma mudança no papel que a mulher exerce como "filha e irmã dedicadíssima, terna e pudica esposa, boa e providente mãe" (linhas 29-31), de acordo com o texto I, é:

(A) o homem exercer uma influência real sobre o destino dela e sobre o destino das nações;

(B) o homem guardar-se de tratá-la como companheira da sua vida, joguete ou escrava;

(C) o homem vê-la como aquela que exerce uma influência real sobre o destino dela;

(D) o homem evitar vê-la como objeto e procurar tê-la como sua companheira de vida;

(E) o homem ser a fonte das alegrias e desventuras dela, desde o berço até o leito de morte.


03
Assinale a opção em que o termo sublinhado não se vincula sintaticamente ao substantivo que o antecede:

(A) "esclarecei seu intelecto com o estudo de coisas úteis" (linhas 1-2)

(B) "Cessai aqueles tolos discursos com os quais atordoais sua razão" (linhas 7-8)

(C) "a mulher de hoje em dia pode sair-se melhor do que aquela" (linhas 11-12)

(D) "quando nada mais é que a escrava dos vossos caprichos" (linhas 9-10)

(E) "trate-a como uma companheira da sua vida" (linhas 19-20)

 

04 Na flexão dos diminutivos, o uso coloquial, com freqüência, se diferencia do uso prescrito pela gramática normativa.
Assinale o par de palavras em que os dois usos ocorrem:

(A) colherzinhas – florzinhas;

(B) mulherzinhas – coraçõezinhos;

(C) florezinhas – mulherezinhas;

(D) mulherzinhas – coraçãozinhos;

(E) colherezinhas – floreszinhas.

 

Texto II

      Nunca esteve tão bom para nós, mulheres.

Nem tão difícil.

      Os salários não são iguais, as creches
continuam insuficientes, o sexo é uma confusão
5 total entre o agir e o sentir, o trabalho é
complicadíssimo em termos psíquicos para a
mulher: fonte de culpa e medos. Nunca foi tão
difícil. Muito está colocado, mas tudo está por
fazer. Esta é uma hora para se parar e pensar.
10 Pensar pelo que brigamos até agora, o que
conseguimos, onde fomos usadas pelo sistema,
o que deu errado, o que fazer de agora em diante.
Sinto que existe todo um trabalho a ser feito de
conscientização feminina — pois o que se passa
15 no Piauí não é o mesmo das grandes capitais —
já que as lutas não serão primordialmente mais
no nível do "queremos", "exigimos", das
passeatas, mas da prática do obter e do ser. É
uma luta mais intimista de um lado, fora dos
20 jornais, mais difusa na realidade.
      A luta de base, de formiguinha, onde o
confrontamento não será mais com a polícia e o
governo somente, mas basicamente com os
companheiros de trabalho, amigos e marido.
Suplicy, Marta . Reflexões sobre o cotidiano. Rio Janeiro: Espaço e Tempo, 1986. p. 124-5.

 

05 Segundo o texto II, a luta fundamental para as mulheres é:

(A) de cada mulher, para conscientizar os colegas, amigos e marido;

(B) de todas as mulheres, contra todos os governos que as oprimem;

(C) dos companheiros de trabalho, amigos e marido, por melhores salários;

(D) dos governos, pela melhoria das condi-ções de vida das mulheres;

(E) das mulheres todas, para exigir seus direitos publicamente em passeatas.


06
Assinale a opção que transcreve a passa-gem do texto II, cujo sentido corresponde ao fragmento de Marina Colasanti:

Culpadas estão quase todas as que trabalham. Porque não estão em casa, onde sempre lhes disseram que deveriam estar. Porque não estão coladas nos filhos. Porque não estão à disposição dos maridos. Porque, cumprindo a sua vida, não se sentem cumprindo à perfeição aquelas que são consideradas suas atribuições primordiais.

Colasanti, Marina . Mulher daqui pra frente. São Paulo: Linoart, 1981.

(A) "Nunca esteve tão bom para nós, mulheres."(linha 1)

(B) "o que se passa no Piauí não é o mesmo das grandes capitais —" (linhas 14-15)

(C) "Os salários não são iguais, as creches continuam insuficientes," (linhas 3-4)

(D) "o trabalho é complicadíssimo em termos psíquicos para a mulher:" (linhas 5-7)

(E) "É uma luta mais intimista de um lado, fora dos jornais,"(linhas 18-20)


07
O uso da partícula se na frase "Esta é uma hora para se parar e pensar." (linha 9) produz um determinado efeito semântico.
Assinale a opção em que se explicita o efeito semântico:

(A) Desvia a atenção do leitor para a pessoa, fora da interlocução.

(B) Realça a ação de alguém através da referência pela 3ª pessoa do singular.

(C) Valoriza a luta da mulher, individualizando-a.

(D) Enfatiza a oportunidade da hora, na luta da mulher.

(E) Enfatiza o sentido dos processos referidos nos verbos no infinitivo.


08
No trecho abaixo, o termo sublinhado tem função anafórica, já que retoma elemento anteriormente expresso.

"A luta de base, de formiguinha, onde o con-fronto não será mais com a polícia e o governo somente, mas basicamente com os companheiros de trabalho, amigos e marido." (linhas 21-24)

Assinale a opção que apresenta o elemento anteriormente expresso:

(A) confronto

(B) formiguinha

(C) luta

(D) polícia

(E) passeatas

 

 09 Uma das frases do texto II apresenta um verbo, cuja regência reproduz característica da frase oral coloquial, fugindo à rigidez da norma culta escrita.

Assinale a opção em que ocorre tal proce-dimento:

(A) "Muito está colocado, mas tudo está por fazer."(linhas 8-9)

(B) "É uma luta intimista de um lado, fora dos jornais, mais difusa na realidade." (linhas 18-20)

(C) "Os salários não são iguais, as creches continuam insuficientes, o sexo é uma confusão total entre o agir e o sentir," (linhas 3-5)

(D) "Sinto que existe todo um trabalho a ser feito de conscientização feminina — pois o que se passa no Piauí não é o mesmo das grandes capitais —" (linhas 13-15)

(E) "Esta é uma hora para se parar e pensar."(linha 9)

 

10 A colocação do pronome pessoal no Português do Brasil, no uso coloquial, apresenta, em algumas circunstâncias, ten-dência diferente da de Portugal.

Identifique o par de orações em que ocorrem, quanto à colocação do pronome pessoal no Português do Brasil, o uso culto e o uso coloquial, respectivamente:

(A) "da qual estamos todas tão distantes que não poder-nos-ia servir de modelo;" (texto I, linhas 13-15) / da qual estamos todas tão distantes que nos não poderia servir de modelo.

(B) "Esta é uma hora para se parar e pensar." (texto II, linha 9) / Esta é uma hora para parar-se e pensar-se.

(C) "pois o que se passa no Piauí não é o mesmo das grandes capitais —" (texto II, linhas 14-15) / pois o que passa-se no Piauí não é o mesmo das grandes capitais.

(D) "purgai a sua alma de tantas nocivas frivolidades pueris de que se acha rodeada mal abre os olhos à luz." (texto I, linhas 4 - 6) / purgai a sua alma de tantas nocivas frivolidades pueris de que acha-se rodeada mal abre os olhos à luz.

(E) "a mulher de hoje em dia pode sair-se melhor do que aquela;" (texto I, linhas 11-12) / a mulher de hoje em dia pode se sair melhor do que aquela.

 

Texto III

QUE EU HEI DE AMAR...
Essa que eu hei de amar perdidamente um dia,
será tão loura, e clara, e vagarosa, e bela,
que pensarei que é o sol que vem, pela janela,
trazer luz e calor a esta alma escura e fria.
5 E, quando ela passar, tudo o que eu não sentia
da vida há de acordar no coração, que vela...
E ela irá como o sol, e eu irei atrás dela
como sombra feliz... — Tudo isso eu me dizia,

quando
alguém me chamou. Olhei: um vulto louro,
10 e claro, e vagaroso, e belo, na luz de ouro
do poente, me dizia adeus, como um sol triste...

E falou-me de longe: "Eu passei a teu lado,
mas ias tão perdido em teu sonho dourado,
meu pobre sonhador, que nem sequer me viste!
Almeida, Guilherme de. Toda a poesia. São Paulo:
Martins, 1952. T.1. p. 146-7.

11 A imagem de mulher que corresponde à do texto III é:

(A) a das mulatas carnudas e sensuais de Jorge Amado;

(B) a das virgens lindas e distantes do ultra-romantismo;

(C) a das louras prostituídas do simbolismo francês;

(D) a de Iracema, modelo de mulher nativa brasileira;

(E) a da mulher satirizada nos poemas de Gregório de Matos.

 

12 O fragmento do texto III, em que se indica claramente que o eu-lírico estava absorvido em seus próprios pensamentos, é:

(A) "E ela irá como o sol, e eu irei atrás dela / como sombra feliz..." (versos 7-8)

(B) "Essa que eu hei de amar perdidamente um dia," (verso 1)

(C) "que pensarei que é o sol que vem, pela janela," (verso 3)

(D) "tudo o que eu não sentia / da vida há de acordar no coração, que vela..."(versos 5-6)

(E) "— Tudo isso eu me dizia / quando alguém me chamou." (versos 8-9)

 

13 A fala da personagem feminina, na última estrofe do poema, permite depreender que, segundo ela, o eu-lírico:

(A) Imaginava amar perdidamente um dia uma mulher loura e bela, e prestava muita atenção às que passavam perto.

(B) Embora estivesse absorto, ainda teve condições de estabelecer relações amorosas com o vulto louro, claro, vagaroso e belo.

(C) Estava tão concentrado nos seus pensamentos sobre a mulher de seus sonhos que nem percebeu que ela, na realidade, estava perto.

(D) Disse que estava tão perdido em seu sonho dourado, que nem passou perto e nem sequer foi percebido por ninguém.

(E) Era um sol que vinha, pela janela, trazer luz e calor à alma escura e fria, sendo loura, clara, vagarosa e bela.

 

14 Na literatura, a visão romântica repre-sentativa da mulher é a de uma figura idealizada, frágil e inatingível.
Assinale a opção em que a visão da mulher não se enquadra nesta característica:

(A) "Ah! Vem, pálida virgem, se tens pena
De quem morre por ti, e morre amando.
Dá vida em teu alento à minha vida,
Une nos lábios meus minha alma à tua !"

Álvares de Azevedo

(B)

"Anjos longiformes
De faces rosadas
E pernas enormes
Quem vos acompanha?"

Vinícius de Moraes

(C) "Anjo no nome, Angélica na cara!
Isso é ser flor, e Anjo juntamente:
Ser Angélica flor, e anjo florente,
Em quem, senão em vós se uniformara."

Gregório de Matos

(D)

"Minha mãe cozinhava exatamente: arroz, feijão-roxinho, molho de batatinhas.
Mas cantava."

Adélia Prado

(E)

"Baixas do céu num vôo harmonioso ! ...
Quem és tu, bela e branca desposada ?
Da laranjeira em flor a flor nevada
Cerca-te a fronte, ó ser misterioso ! ..."

Castro Alves

 

Texto IV

15 Assinale a opção em que não há uma significativa correspondência de idéias no comentário feito acerca do cartum e dos textos I, II e III.

 (A) O cartum distancia-se do texto III porque não representa uma imagem vaga de um vulto de mulher sonhada.

(B) O cartum ratifica as questões apresenta-das no texto I, porque representa a imagem da mulher em luta pela sua própria emancipação.

(C) O cartum não reflete o texto I, porque não representa integralmente a imagem da mulher educada pelo homem, para ser o que deve ser: "filha e irmã dedicadíssima, terna e pura esposa, boa e providente mãe."(linhas 29-31)

(D) O cartum , sob certos aspectos, confirma o seguinte trecho do texto II: "Os salários não são iguais, as creches continuam insuficientes, o sexo é uma confusão total entre o agir e o sentir," (linhas 3-5)

(E) O cartum apresenta a imagem de uma mulher real, em total desacordo com a representação da mulher no texto III.